quarta-feira, 18 de maio de 2011

Ensaio sobre a Veracidade

            Vazio de si caminhava. Como se, em contraposição à corrente filosófica que martiriza aquilo que é do todo e entroniza aquilo que é inacessível, permanecesse inerte em meio a um turbilhão de transeuntes da calçada vindos de lá e de cá.
            Era como o início de tudo, o vácuo em pessoa, como se necessitasse de algo ou alguém, sobrenatural ou não, que, de astúcia de ourives, lhe detalhasse as formas, fabricasse-lhe os traços, e lhe preenchesse de conteúdos e, mesmo sendo estes vãos e piegas, lhe dotasse, ao menos de sociabilidade.
            Caminhar era como uma fuga desenfreada, mesmo sendo um trocar de pernas sereno, minguado, quase sem vida. Este homem, ou mulher, ou qualquer coisa de inabitado que seja, pois a forma lhe falta, que vai a andar não o faz em linear caminho, entorta resignado em meandros, vielas e buracos como se as sombras da caverna buscasse. Pudesse ser que lá encontraria Platão e este com seus largos ombros e suas brancas barbas lhe infundisse a tal da ideia, que de tão imaterial que é apresenta-se perfeita. Talvez travasse um duelo maiêutico com o mesmo utilizando-se da famosa ironia socrática, mas o nosso herói é seco, sem substância, sem forma e, sendo assim afigurado, Platão lhe mostraria os dentes em gargalhada e lhe injuriaria, Como podes travar de duelo maiêutico com o discípulo amado do pai da maiêutica, e assim provaria do veneno mortífero dos falsos saberes.
            Ora, todo homem é bom, todo homem constrói a si mesmo, mas não sendo a matéria o que lhe falte e sim a essência, o nosso ser inabitado continua a andar circundado por uma “treva branca” capaz apenas de lhe fazer sentir. Talvez seja por conta do jejum das imagens, tendo em vista ser fato que elas muita falta nos fazem, talvez fosse pela falta de Deus que distante se mostrou, inacessível, dono do poder supremo e do castigo eterno de todos. Ora, talvez fosse pela metamorfose, sim, transformou-se em caixeiro-viajante de grotesco aspecto quando na realidade era besouro de ínfima massa encefálica, preocupava-se única e exclusivamente em alimentar-se e defender-se dos predadores, era todo instinto e, sendo assim, todo essência. A nós, que aqui distantes acompanhamos os passos de tal ser, de pouco resultado rejubilaríamos ao elencar hipóteses para a afiguração do nosso herói, seria antes de maior efetividade lhe darmos nós a forma a que tanto busca, despejar-lhe a essência pelas narinas, pois essa é a nossa esperança, a de que no fim destas linhas, tão grotescas quanto o caminhante, a forma convença-se de si mesma, sendo o conteúdo a própria forma.


            Inacabado ficará o texto, inacabado ficará o herói, pois aqui já ricos estamos de verossimilhança, de ideias. O que nos falta é a materialização do próprio ser, a verdade embutida na atitude.

Os Estados Unidos exibiram as imagens de Dominique Strauss-Khan algemado. O diretor do FMI, por enquanto, não foi julgado e muito menos condenado. É apenas suspeito de ter atacado sexualmente uma camareira em um hotel da região do Times Square.
(Fone: estadao.com.br – 18/05/2011)

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